Público
FTAA.soc/civ/46
10 de junho de 2002
Original: Português
Portuguese only/Só
em Português/ Sólo en Portugués
ALCA -
COMITÊ DE REPRESENTANTES GOVERNAMENTAIS SOBRE A PARTICIPAÇÃO
DA
SOCIEDADE
CIVIL
CONTRIBUIÇÃO RELACIONADA COM O CONVITE PÚBLICO
Nome(s) |
“Agricultura na OMC - estágio atual das negociações”
Arnoldo de Campos |
Organização(ões) |
Grupo de Trabalho de Agricultura da REBRIP
|
País: |
Brasil |
DESER/ACTION AID
NEGOCIAÇÕES AGRÍCOLAS NA ALCA
Arnoldo de Campos
Economista Deser
Curitiba, dezembro de 2001.
Índice
Índice
Introdução
1) Breve Histórico da ALCA
2) O movimento social e a ALCA
2.1 Movimento Sindical
2.2. Articulações Internacionais
2.3. Foro de São Paulo
3) Agricultura na ALCA
3.1 Exportações agrícolas
3.2 Importações Agrícolas
4) Os principais atores do comércio agrícola na ALCA
4.1 EUA
4.1.1 Políticas de controle e regulamentação das
importações
4.1.2 Políticas de apoio interno e exportações
4.1.3 Empresas multinacionais
4.2 Canadá
4.2.1 Principais instrumentos de política
comercial no Canadá
4.3 Chile
4.3.1 Principais instrumentos de proteção interna
4.4 México
4.4.1 Principais instrumentos de proteção interna
4.5 Brasil
4.5.1 Principais instrumentos de proteção interna
5) As negociações sobre agricultura na ALCA
5.1 Principais Atores e interesses
5.1.1 EUA
5.1.2 Brasil
6) As negociações na ALCA
6.1 Estrutura das negociações
6.2 As Reuniões Ministeriais
6.3 O Grupo de Negociações sobre Agricultura (GNAG)
6.4 O Acordo Agrícola da ALCA
7) Conclusões
Bibliografia
Introdução
Encontra-se em fase decisiva o
processo de negociações da ALCA (Área de Livre Comércio das Américas). O
processo negociador apontou abril de 2002 como prazo limite para uma série
de definições preliminares. Em agricultura estão previstas definições:
sobre o método de desgravação tarifária, o alcance das negociações nessa
área; definições preliminares sobre o tratamento aos subsídios de
exportação e outras políticas do gênero que distorcem o comércio;
definições sobre métodos e processos para as negociações das medidas
sanitárias e fitossanitárias, entre outros temas de relevância. Apesar de
importantes, esses temas não tocam nos principais problemas que podem
ocorrer em consequência da integração hemisférica. A assimetria das
economias agrícolas da região, as economias menores, a prevenção de
impactos no emprego, políticas de desenvolvimento, de não exclusão,
transparência e participação não estão previstas no acordo, embora
apareçam nas declarações de cúpula. Esse ambiente gera muita preocupação
entre os agricultores e suas organizações.
Ainda não estão claros quais os
benefícios e malefícios que esse processo pode acarretar a economia
agrícola do país e ao meio rural. As decisões estão sendo tomadas num
ritmo mais acelerado do que o necessário para que a sociedade e o próprio
governo possam tomar decisões mais legitimadas e coerentes com os
interesses nacionais.
A estrutura oficial das negociações
e os seus métodos de decisão no espaço multilateral ainda são bastante
fechados, restritos aos governos e aos setores do grande empresariado.
Ao nível nacional, o governo FHC tem
discursado em favor da transparência nas negociações, da maior abertura
para participação social e de uma tentativa de construção de consenso
interno a respeito do posicionamento brasileiro. O governo tem se reunido,
eventualmente, inclusive, com as organizações da agricultura familiar.
Esse processo ainda é muito tímido por parte do governo, sendo o
Ministério das Relações Exteriores, que coordena todo o processo, pouco
conhecedor da realidade vivida pelos agricultores brasileiros, sobretudo
os familiares. Predomina uma visão de que a agricultura tem a função
fundamental de gerar divisas para o país e que isso seria obtido através
da ampliação do acesso a mercados por parte do nosso agronegócio.
Este cenário aponta para um enorme
desafio para as organizações da agricultura familiar e do campo como um
todo: como qualificar e intensificar a participação nesses processos com
vistas a interferir ou mesmo alterar rumos que não estejam de acordo com
os interesses do setor.
Neste breve estudo pretende-se
trazer informações sobre a agricultura e comércio no espaço da ALCA, a
evolução das negociações, seu estágio atual e possíveis implicações.
Pretende apresentar os principais posicionamentos governamentais dos
países envolvidos, assim como apresentar também alguns comentários e
críticas referentes ao processo de integração e negociação. Com isso
objetiva-se permitir que as organizações da agricultura familiar possam
encontrar mais elementos para sua atuação e interferência nos processos
negociadores.
1) Breve Histórico
da ALCA
A Área de Livre Comércio das
Américas (ALCA) decorre da chamada "Iniciativa para as Américas", proposta
pelo então Presidente dos EUA, George Bush, no início dos anos 90.
Assim como o NAFTA (México, EUA e
Canadá), a ALCA foi um projeto desenvolvido por um governo republicano,
mas foi sendo negociado durante o governo Clinton, democrata que assumiu
em 92, após 12 anos de republicanos no poder. Agora, com a eleição de
Busch, os republicanos voltam a dirigir o país e, consequentemente, as
negociações internacionais.
Participam das negociações 34 países
das Américas, com a exceção de Cuba. O bloco reúne uma população de quase
740 milhões de habitantes, sendo 380 milhões (51%) no NAFTA e 215 milhões
(25%) no Mercosul. Os EUA sozinhos respondem por 79% do PIB da região, 70%
do comércio externo e 35% da população. O Brasil responde por 21% da
população, 6,2% do PIB e 4% do comércio.
A reunião de Cúpula de Miami, de
dezembro de 1994, reuniu Chefes de Estado e de Governo de trinta e quatro
países das Américas, sendo o único o país ausente Cuba. Na ocasião, foi
lançada a idéia de iniciar-se a negociação de uma Área de Livre Comércio
das Américas (ALCA), do Alasca à Patagônia, com vistas à sua conclusão em
2005. As decisões da Cúpula de Miami encontram-se consolidadas na
Declaração de Princípios e no Plano de Ação aprovados na ocasião.
Solicitou-se a OEA, BID e CEPAL a assistência técnica ao processo de
integração e decidiu-se promover reuniões anuais de ministros para avaliar
e coordenar o processo1.
Basicamente, a ALCA pretende ser uma
área de livre comércio de produtos, dinheiro e, em alguns casos, de
serviços. Além disso, o acordo pretende disciplinar investimentos,
propriedade intelectual, entre outros temas de interesse maior dos EUA e
Canadá. Não é sua intenção a criação de uma integração econômica completa,
nos moldes da União Européia, por exemplo. Assim, não haverá espaço para a
livre circulação de pessoas. Nem chega a ser uma proposta parecida com o
Mercosul, onde existe uma tarifa externa comum, além de várias políticas
integradas. A proposta é restrita a eliminação das barreiras comerciais
entre os países da região, mais parecida com o NAFTA.
Após a Cúpula de Miami, foram
realizadas, até o momento, seis reuniões ministeriais sobre a ALCA: em
1995, em Denver nos Estados Unidos; em 1996, em Cartagena na Colômbia. O
Brasil organizou, em 1997, em Belo Horizonte, a terceira reunião
ministerial. Em março de 1998, teve lugar, em São José da Costa Rica, a
quarta reunião ministerial da ALCA, que marcou o final da fase
preparatória e o início efetivo das negociações. Foi criado o Comitê de
Negociações Comerciais (CNC), que se reuniu pela primeira vez em Buenos
Aires. Em abril de 1998, reuniu-se em Santiago no Chile, a Segunda Cúpula
das Américas, que discutiu o estágio das negociações da ALCA e diversos
outros temas. Com relação a ALCA, a Cúpula recordou que as negociações
deveriam estar concluídas até 2005. Também foi acordado que os Ministros
aprovariam, até o ano 2000, medidas de facilitação de negócios. O Brasil
já as implementou. Em novembro de 1999, realizou-se em Toronto, Canadá, a
Quinta Reunião Ministerial da ALCA, onde foram estabelecidas diretrizes
para o futuro das negociações até a Reunião Ministerial de Buenos Aires,
em abril de 2001. A sexta reunião ocorreu em Buenos Aires, em abril de
2001.
As discussões da ALCA desenvolvem-se
em nove grupos de negociação - Acesso a Mercados; Agricultura; Serviços;
Investimentos; Compras Governamentais; Solução de Controvérsias; Direitos
de Propriedade Intelectual; Subsídios, Antidumping e Medidas
Compensatórias; e Políticas de Concorrência - e em três instâncias não
negociadoras - Grupo Consultivo sobre Economias Menores; Comitê de
Representantes Governamentais sobre a participação da Sociedade Civil; e
Comitê Conjunto de Especialistas do Governo e do Setor Privado sobre
Comércio Eletrônico. Os grupos negociadores e as três instâncias não
negociadoras se reportam ao Comitê de Negociações Comerciais (CNC).
A definição dos mandatos dos nove
Grupos de Negociações da ALCA ocorreu em Buenos Aires, durante a I Reunião
do Comitê de Negociações Comerciais (CNC), realizado no período de 17 a 19
de junho de 1998.
Uma contradição é evidente nos
documentos de cúpula. Há uma ausência de definições sobre como a
agricultura e o meio rural vão de fato ser transformadas em eixo
fundamental para o desenvolvimento sustentável da região. No Plano de Ação
e na Declaração Ministerial, essas preocupações não são incorporadas nas
tarefas e prazos estabelecidos para os diferentes grupos de negociação.
2) O movimento social e a ALCA
2.1 Movimento Sindical
O movimento sindical através da
CIOLS/ORIT (representante das organizações sindicais das Américas)
realizou em Denver, em 1995 uma Conferência Paralela aprovando um
documento que manifestou as preocupações e reivindicações em relação ao
processo de integração. No entanto, a Declaração final dos governos em
Denver aprovou a participação dos "setores econômicos" (empresários) e
definiu que o respeito e a promoção dos direitos dos trabalhadores deve se
dar através dos respectivos governos, ignorando o documento da CIOLS/ORIT.
A partir daí a CIOLS/ORIT vem participando de todos os eventos da ALCA em
conferências paralelas articulando e fortalecendo os Fóruns da Sociedade
Civil. As Centrais Sindicais entendem que só a democratização e a garantia
da dimensão social podem assegurar os direitos e interesses dos
trabalhadores. Nesse sentido, a ALCA começa mal, dando espaço oficial para
que o setor empresarial participe do processo, enquanto que aos
trabalhadores lhes e negado o direito de influenciar no debate.
A CUT/Brasil também vê com reservas
o processo de integração da ALCA, destacando problemas como a assimetria
entre os países, os temas que estão sendo negociados, especialmente
investimentos, serviços e propriedade intelectual, nos quais o Brasil tem
pouco a ganhar. A central tem defendido a realização do plebiscito para
definição da adesão ou não ao projeto de integração. Kjeld Jakobsen2 ,
representante da CUT sobre o tema, alerta ainda para os perigos de acordos
na ALCA que levem a maior internacionalização da economia brasileira. Isso
já vem ocorrendo sem o acordo da ALCA. Certos produtos, como os
eletrônicos, tema de negociações também do acordo, podem significar maior
dependência em importações. Para Kjeld mais abertura vai significar mais
desemprego. O Brasil já conhece a história. Nos anos 90, uma das
consequências do processo de abertura e redução de tarifas foi a extinção
de 1/3 dos empregos na indústria do país.
Para a Contag (Confederação Nacional
dos Trabalhadores em Agricultura), a ALCA significará aumento da
dependência externa e inviabilidade de um projeto de desenvolvimento
independente para o país3 . A organização tem participado de todos os
espaços nacionais de negociação sobre o tema, com destaque para sua
participação na Senalca e no grupo nacional de negociações sobre
agricultura na ALCA. A Contag, no espaço da ALCA, se articula
principalmente com a RIAD (Rede Interamericana de Agricultura e Democracia),
que reúne organizações sindicais e ONG’s do continente, mas também tem
dialogado com outras organizações internacionais, como a Via Campesina4 e o
CLOC (Coordenadoria Latino-Americana de Organizações Camposesas).
O MST também tem se posicionado
contra o acordo continental e participado ativamente de articulações
internacionais na região como o CLOC e a Via Campesina. Ambas as
organizações tem posição bastante crítica quanto ao processo da ALCA.
A Frente Sul da Agricultura Familiar5 também expressa sua preocupação, destacando que o acordo Mercosul,
realizado entre economias com menos assimetrias, já trouxe prejuízos
enormes para os agricultores do país. A organização teme que a ALCA, ao
integrar a economia brasileira com a americana e canadense, cause ainda
mais problemas para o campo.
2.2. Articulações Internacionais
Paralelamente ao foro oficial de
negociações, ocorre regulamente encontros e negociações entre as
organizações sociais do continente. No campo da agricultura e do
desenvolvimento rural existem inúmeras organizações com atuação
internacional e que definem estratégias comuns de atuação. Estas
organizações se articulam na região de diversas formas, entre elas a Via
Campesina e a RIAD. Ambas tem posicionamento bastante crítico em relação
às negociações comerciais.
A Via Campesina conta com a
participação de organizações de quase todos os continentes. No Brasil a
principal é o MST. Para a Via Campesina, o espaço das negociações
comerciais deveria se dar principalmente na ONU e não na OMC e nos acordos
regionais. A organização coloca como pré-requisito para que as negociações
sejam estabelecidas a participação das organizações sociais, o que não tem
sido garantido no processo da ALCA. A Via Campesina pede a eliminação de
todas as políticas de ajuda direta ou indireta às exportações. A
organização entende que as negociações deveriam estar subordinadas aos
interesses de segurança alimentar e dos direitos humanos, em contraposição
a lógica dominante das grandes multinacionais.6
A RIAD, por sua vez, foi criada em
1992, no México por organizações de vários países do continente. No Brasil,
atualmente, tem maior participação nessa articulação a Contag, o IBASE,
entre outras. A organização critica a filosofia adotada pela maioria dos
governos que vêm o mercado como regulador da economia. A organização
critica também o formato das políticas internacionais nos últimos anos,
que tenderam, segundo a organização, para conformar interesses dos países
com excedentes de produção, com políticas fortes de ajuda interna e
subsídios à exportação. A RIAD apresenta-se defendendo a agricultura
familiar como setor estratégico para o desenvolvimento da região e a
segurança alimentar como direito dos povos.7
2.3. Foro de São Paulo
Para o Foro de São Paulo, que reúne
grupos e partidos de esquerda e centro esquerda na América Latina, o
possível acordo da ALCA possui vários problemas, entre eles destacam-se8:
-
O acordo pretende a integração de economias
assimétricas, o que sem políticas diferenciadas e de redução das
assimetrias tornará problemática a situação de vários países;
-
O acordo, na forma em que está sendo construído,
congelaria a atual divisão do trabalho no continente, frustrando o
crescimento diversificado da indústria, agricultura e serviços fora dos
EUA;
-
O comércio não pode ser negociado desvinculado de um
projeto de desenvolvimento para a região. Qualquer iniciativa de
integração deve promover políticas comuns a favor de um desenvolvimento
equitativo;
-
A ALCA, na
forma como está, representa uma regressão de tipo colonial e que gerará
profunda instabilidade econômica, social e política na região.
O grupo propõe ainda:
-
Construir propostas alternativas a ALCA
-
Exigir maior transparência e publicidade das
negociações;
-
Buscar aliados entre os parlamentares do continente;
-
Procurar aliados dentro dos EUA, com visão crítica à
integração que está sendo proposta;
-
Vai defender
a realização de plebiscitos para a adesão ou não a ALCA.
A próxima reunião do Foro de São
Paulo ocorrerá ainda no mês de dezembro de 2001, na cidade de Havana,
Cuba, entre os dias 4 a 7.
3) Agricultura na ALCA
No espaço da ALCA quatro países destacam-se como mais representativos em
termos de produção e comércio agrícola. Em primeiro lugar estão os EUA,
com uma produção de aproximadamente 480 milhões de toneladas de grãos,
carnes e leite. A produção e as exportações agrícolas americanas se
concentram nos principais grãos: soja, trigo, milho e algodão. O segundo
país mais importante da região em termos de agricultura é o Canadá. O
Canadá é também um grande exportador de grãos, principalmente trigo, e
leite. O Brasil é o terceiro país mais importante com uma produção de
grãos, carnes e leite de aproximadamente 124 milhões de toneladas, seguido
da Argentina, com 80 milhões. O Brasil exporta principalmente soja, café,
açúcar, suco de laranja, carnes e fumo, além de madeira e derivados e
calçados. A Argentina, por sua vez, exporta soja, trigo, milho, leite,
carnes, entre outros produtos. Tem alguma expressão na região o Chile e a
Comunidade Andina (Bolívia, Colômbia, Equador, Venezuela e Peru).9
Os demais países podem ser divididos
em diferentes situações, conforme sua relação com o comércio internacional.
Existem aqueles em que as exportações agrícolas ainda são parte principal
das exportações, mas que têm pouco ou nenhum peso no comércio
internacional. Esses são os casos, por exemplo Equador, Nicarágua,
Colômbia, entre outros. Há um grupo de países que são mais dependentes de
importações agrícolas, como a Guatemala e outros pequenos países. As
importações desses países não têm grande expressão em termos de volumes
comercializados. Esses dois últimos grupos de países têm uma outra
característica, a distribuição de suas relações comerciais é altamente
concentrada nos EUA, pelo menos a grande maioria deles. Isso faz com que a
influência americana seja maior.
3.1 Exportações agrícolas
O comércio agrícola mundial
movimentou perto de US$ 544 bilhões em 1999, segundo dados da OMC. As
exportações agrícolas totais da ALCA estão próximas dos US$ 200 bilhões,
representando perto de 35% das exportações totais do planeta.
No que diz respeito aos principais
blocos do continente, o NAFTA exportou aproximadamente US$ 100 bilhões,
20% do total mundial e quase 55% do total regional. O Mercosul, mais Chile
e Bolívia, exportaram juntos aproximadamente US$ 40 bilhões, 7% mundial e
20% do bloco.
No espaço das Américas, quatro
países destacam-se como grandes exportadores agrícolas: EUA, Canadá,
Brasil e Argentina, pela ordem de importância.
Na América do Norte encontra-se o
maior exportador mundial de produtos agrícolas. Os EUA exportaram US$ 66
bilhões em 99, mais do que o total exportado pela América Latina. O Canadá
também está situado entre os maiores exportadores agrícolas do mundo,
chegando a US$ 32 bilhões no mesmo ano. O Brasil exportou US$ 16 bilhões e
a Argentina US$ 13 bilhões. Todos os dados são da OMC.
O Mercosul, mais Chile e Bolívia
representam quase US$ 40 bilhões em exportações agrícolas, mais ou menos
20% do total das Américas.
Com relação ao destino das
exportações, no caso do NAFTA, o principal comprador é o continente
asiático, com US$ 33 bilhões, ou 1/3 das exportações totais. Em seguida, o
NAFTA é responsável por U$ 32 bilhões. Para os países da América latina
destinam-se aproximadamente US$ 13 bilhões, ou 13% do total exportado. US$
14 bilhões vão para a Europa Ocidental.
O Mercosul, por sua vez, tem na
Europa Ocidental o seu principal mercado, representando mais de 40% das
exportações do Bloco. Para o Nafta o bloco destina perto de 20% de suas
exportações agrícolas. O comércio intra-bloco também representa perto de
20% das exportações totais. Perto de 10% vai para os países da América
Latina, sendo o restante distribuído entre as demais regiões.
As exportações agrícolas têm maior
peso nas economias do sul do continente. Para os latino-americanos, as
exportações agrícolas correspondem a 20% do total enquanto que esse número
é de 10% para os países da América do Norte. Apenas 9,5% das exportações
totais americanas são de produtos agrícolas. Para a Argentina esse
percentual ultrapassa os 50%. Para o Canadá, o peso das exportações é de
14%, enquanto que para o Brasil é de 34%.
3.2 Importações Agrícolas
Os países que compõem a ALCA juntos
importam menos do que exportam, acumulando na região um expressivo
superávit comercial que deve ter chegado aos US$ 90 bilhões de dólares em
99, ou 17% das importações mundiais, segundo dados da OMC.
Em relação aos dois principais
blocos do continente, o NAFTA é o maior importador, com US$ 90 bilhões. O
saldo comercial do bloco é pequeno, de aproximadamente US$ 10 bilhões, a
maior parte no Canadá. Os EUA têm uma balança agrícola equilibrada e o
México acumula déficit’s crescentes. O Mercosul, mais Chile e Bolívia,
importaram juntos, menos de US$ 8 bilhões, significando um saldo comercial
de aproximadamente US$ 30 bilhões, três vezes maior que o saldo do NAFTA e
1/3 de todo o saldo da região.
O maior importador isolado do
continente é os EUA, com US$ 66 bilhões de gastos com importação em 99. Em
seguida aparece o Canadá, com US$ 14,3 bi, o México, com US$ 9,7 bi e o
Brasil com U$ 5,1 bilhões, todos em 99 conforme dados da OMC.
Para o Nafta, as importações são
provenientes principalmente do interior do bloco (28%), da América Latina
(28%), da Europa Ocidental (20%) e Ásia (20%).
4) Os principais atores do comércio
agrícola na ALCA
Neste tópico a idéia é
sinteticamente descrever as principais políticas utilizadas no espaço das
Américas pelos países que tem mais atuação no comércio agrícola da região.
A principal fonte de informação nesse sentido é a publicação do MDIC (Ministério
do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior): Barreiras externas às
exportações brasileiras, de 1999. A análise se concentrará nas medidas de
defesa, controle e regulamentação das importações, mas tratará também das
políticas de apoio interno e de apoio às exportações. O aspecto
interessante da análise citada decorre da interpretação da política
comercial dos países com os quais o Brasil mantém relações comerciais..
4.1 EUA
A relação comercial brasileira com
os EUA vai muito além do comércio agrícola. A pauta de exportações e
importações entre os dois países é bastante variada. Tanto americanos
quanto brasileiros trocam produtos dos mais diferentes setores, com uma
vantagem para a pauta americana mais concentrada em produtos de maior
valor agregado. Os novos produtos do mundo da informática, desde
componentes até programas de computador são importados em grandes
quantidades pelo Brasil. As relações comerciais também são intensas no
campo de atuação das multinacionais. Os EUA, isoladamente, estão entre os
países que mais investem no Brasil, tendo instaladas no país inúmeras de
suas empresas, inclusive no setor de alimentação, fumo e bebidas. Em 1996,
os americanos investiram no Brasil US$ 20 bilhões, sendo menos de 3% no
setor de alimentação.
Perto de 20% das exportações totais
do Brasil vão para os EUA, sendo o país que mais importa do Brasil
isoladamente. Em 98 o Brasil exportou US$ 10 bilhões, contra importações
de US$ 13 bilhões. Atualmente a balança comercial entre os dois países
está mais equilibrada. Em termos de agricultura, o Brasil acumula
superávit. Os principais produtos exportados pelo Brasil para os EUA são
fumo, suco de laranja, açúcar, castanha de caju, entre outros. Pelo lado
das importações há uma variedade de produtos, com oscilações na
importância de cada um deles. São comuns importações de trigo, soja,
cerveja, fumo, milho, entre outros. Atualmente as importações estão em
níveis mais baixos, propiciando saldos comerciais próximos a US$ 1 bilhão.
A agricultura americana é uma das
mais competitivas do planeta, responsável pela movimentação das maiores
quantidades de recursos no mercado internacional. No espaço das Américas
esse desempenho é mais modesto, uma vez que a maioria dos países da região
tem necessidades menores de importação de alimentos ou são fortes
exportadores.
Em termos de participação no PIB do
país, a agricultura representa menos de 2%. O PIB total americano foi de
US$ 8,2 trilhões em 1998, segundo dados da OMC.
Em relação às medidas para o
comércio agrícola, os americanos estão entre os que possuem uma das mais
complexas políticas para o setor. Um emaranhado de políticas de proteção
interna, estímulo à produção e políticas de comércio exterior são
utilizados pelos americanos.
4.1.1 Políticas de controle e
regulamentação das importações
A tarifa média para entrada no
mercado americano é de 5,2%, sendo a tarifa máxima de 350%. As tarifas
médias mais elevadas estão vigorando para os produtos do reino animal e
vegetal e para os produtos das indústrias de alimentos, bebidas e fumo.
Os EUA praticam vários tipos de
políticas em relação às importações, entre elas destacam-se:
Tarifas específicas
- as tarifas específicas americanas são geralmente maiores que as tarifas
normais aplicadas às importações, uma vez que a tarifa específica é
proporcionalmente maior quanto menor é o preço do produto. Os americanos a
utilizam principalmente para produtos do setor agroalimentar. Entre os
produtos brasileiros que sofrem a incidência de tarifas específicas no
mercado americano destacam-se: fumo, suco de laranja, abacaxi, abacate,
laranja, limão, uva e pêra. O suco de laranja é um dos produtos que tem
tarifas maiores, podendo chegara a mais de US$ 0,08 por litro concentrado.
Com esse tipo de instrumento os americanos incentivaram a produção interna,
especialmente a da Flórida. Costa Rica e México tem preferências
tarifárias, decorrentes do NAFTA.
Tarifas sazonais -
é um instrumento que serve para elevar as tarifas de importação em
determinados períodos, principalmente em épocas de colheita ou de
superprodução. Frutas e vegetais contam com esse tipo de instrumento de
proteção interna.
Preferências Tarifárias -
os americanos utilizam um sistema de preferências tarifárias, negociadas
caso a caso, país por país ou com blocos econômicos. As preferências
vigoram por um período específico, levando a necessidade de renegociações
periódicas. O Brasil tem algumas preferências tarifárias, constantes no
Sistema Geral de Preferências. Mas a maior parte desse regime dirige-se
aos países do NAFTA, Israel, Caribe, Pacto Andino, China, União Européia,
Japão e Coréia.
Quotas -
esse instrumento serve para distribuir entre os países exportadores de um
determinado produto às quantidades que cada um tem direito de exportar
para o mercado americano. O Acordo Agrícola do GATT estabeleceu que todas
as medidas não tarifárias deveriam ser tarificadas. Dessa forma, a
política de cotas estabelece tarifas abaixo da cota e acima da cota. O
Brasil tem questionado fortemente esse tipo de política, que serve para os
americanos estabelecer relações bilaterais de maior dependência por parte
de seus parceiros. Uma determinada cota pode ser pouco representativa no
mercado americano, mas muito representativa para o país exportador. Nesse
sentido, pequenas economias acabam sendo beneficiadas pela política de
cotas americana. Entre os principais produtos sujeitos a política de cotas
americana estão: bovinos, laticínios, açúcar, fumo, algodão, amendoim,
chocolate, laranja e azeitonas. Entre os produtos brasileiros que estão
sob regime de cotas no mercado americano destacam-se o fumo e o açúcar.
Para se ter uma idéia da restrição à entrada do produto brasileiro no
mercado americano pode-se observar o caso do açúcar. Para exportações
abaixo da cota a tarifa é de US$ 0,0146, perto de 3,4% do valor de entrada
do produto. Acima da cota, essa tarifa chega a US$ 0,349, ou 82% do valor
do produto. Para o açúcar a fatia destinada ao Brasil é de 13,5% da cota,
enquanto que a Republica Dominicana tem direito a mais de 16% da cota
total para o produto.
Com relação ao fumo, a proteção à
produção doméstica é regulada por lei, sendo estabelecido obrigatoriedade
de 75% da produção de cigarros ter matéria-prima doméstica. Dessa forma,
com o tipo de fumo que o Brasil exporta, pode-se disputar apenas 10% do
mercado americano. Das 750 cotas utilizadas pelos americanos, apenas 2
foram eliminadas desde o acordo agrícola do GATT.
Mididas anti-dumping e
compensatórias - os EUA destaca-se pela
constante utilização desse tipo de medida, sendo o Brasil um dos países
mais penalizados. Para o governo brasileiro, os americanos possuem uma
legislação muito subjetiva e arbitrária, podendo estar utilizando o
instrumento como mecanismo protecionista. Sofreram questionamento dos
americanos e aplicaram-se medidas anti-dumping ou compensatórias contra o
suco de laranja brasileiro, máquinas e ferramentas agrícolas.
Salvaguardas
- é um mecanismo através do qual se aplicam taxas adicionais as
importações realizadas fora da quota e quando os preços de importação
estão abaixo do preço de referência consolidado na OMC, cuja base de
cálculo são os anos de 1986/88. As empresas domésticas precisam comprovar
dano e apresentar cronograma de estruturação para que as medidas de
salvaguardas possam ser aplicadas.
Unilateralismo
- são medidas que estão em legislação americana de 1974 e que podem
significar retaliações comerciais unilaterais por parte dos EUA quando
consideram que um determinado país prejudicou o comércio americano de
forma “não razoável, injustificável ou discriminatória”.
Normas e regulamentos técnicos -
não estão submetidos aos organismos internacionais e penalizam alguns
produtos agropecuários.
Normas sanitárias, fitossanitárias e
de saúde animal - é um conjunto de normas e
regulamentos que na maioria dos casos, principalmente para os produtos
alimentares, demoram anos para que sejam apreciados pedidos de inspeção,
exigindo um aparato institucional e financeiro das empresas solicitantes.
Esse processo por si faz com que muitas vezes as empresas desistam de
tomar iniciativas para entrar no mercado desse país. Vários produtos
brasileiros sofrem restrições sanitárias nos EUA, entre os principais
destacam-se as frutas e vegetais, as carnes. É proibida a exportação de
carne bovina in natura, mesmo que os acordos internacionais considerem
satisfatória a qualidade da carne brasileira. Produtos enlatados são
fiscalizados na planta industrial.
Regras de etiquetagem
- os americanos também possuem uma legislação bastante rigorosa no que diz
respeito ao tipo de informação contido nos rótulos e embalagens de seus
produtos importados. Os produtos alimentícios e agrícolas, especialmente,
quando importados, sofrem uma série de exigências com relação ao conteúdo
dos rótulos e o tipo de informação sobre os produtos. Esse tipo de regra é
estabelecido nos três níveis de organização do Estado Americano: nacional,
estadual e municipal. Isso significa que o produto pode estar dentro das
especificações nacionais, mas não podendo ser exportado para determinados
estados ou cidades, por conta das exigências adicionais locais. A
complexidade e a falta de transparência das normas leva a barreiras
comerciais difíceis de serem superadas.
4.1.2 Políticas de apoio interno e
exportações
Os EUA contam também com um
verdadeiro arsenal de medidas de apoio interno a produção. Os principais
instrumentos da política agrícola nos EUA são os pagamentos diretos e os
créditos à exportação, mas os norte-americanos se utilizam também de
vários outros instrumentos, como a sustentação de preços. Em 2000 os
americanos gastaram perto de US$ 90 bilhões de reais com esse tipo de
política. Nem todos os instrumentos de política agrícola utilizados pelos
americanos são objeto de regulamentação multilateral. Os créditos e
seguros à exportação, embora reconhecidamente capazes de provocar
distorções no comércio, ainda não foram objeto de maior regulamentação
multilateral.10
4.1.3 Empresas multinacionais
Mais do que em qualquer outro país
do mundo, as empresas multinacionais americanas têm um peso importante nas
negociações comerciais, assim como no próprio comércio. Existem empresas
de diferentes setores. Estão presentes em vários países da região empresas
americanas de diferentes ramos, como o da alimentação, de bebidas, fumo,
por um lado, as biotecnológicas, de máquinas e equipamentos, insumos,
etc., por outro. Existem ainda empresas que têm estratégias de expansão
voltadas para a inserção nas economias da região, atuando mais voltadas
para o mercado interno desses países, buscando também a obtenção de
sinergia entre suas diferentes posições na região. Existem aquelas que
trabalham “maquilando” produtos em outros países, mas utilizando insumos
em sua maioria próprios. Existem ainda as empresas que exportam desde os
EUA.
Em agricultura, a máquina comercial
americana atua em várias frentes. Há forte pressão das empresas do setor
de máquinas, equipamentos e insumos, para a abertura de novos mercados
para suas empresas. Tem forte presença o setor de biotecnologias, tentando
impor regulamentos nacionais que não levantem barreiras a esse tipo de
tecnologia. Esse tipo de interesse é defendido intensamente nos grupos que
discutem propriedade intelectual e patentes. Merece mansão ainda o
capítulo de investimentos, que tem atenção especial das empresas de todos
os setores citados e que buscam constituir ambientes de menor risco e
menor concorrência possível no espaço das Américas.
Essas empresas muitas vezes
confundem-se com o próprio interesse de Estado americano, sendo muito
importante acompanhar seus movimentos e posicionamentos.
4.2 Canadá
O Canadá também é conhecido por seu
arsenal de medidas de proteção ao comércio local, especialmente o de
alimentos e produtos agrícolas. Mas, diferentemente dos EUA, suas
políticas de apoio interno não se encaixam dentro das que distorcem o
comércio em proporções semelhantes como as dos seus vizinhos americanos. O
Canadá também tem passado por processo de concentração na agricultura, com
redução do número de estabelecimentos e os demais efeitos de políticas
voltadas para a elevação da produção com base no crescimento da
produtividade. Seu setor agroindustrial passou por um processo de
internacionalização no qual apenas um grupo de grandes empresas manteve
sua participação no mercado.
Em termos de alimentos e produtos
agrícolas, o Brasil ainda não é um grande exportador nem importador do
Canadá. A presença canadense no Brasil se dá principalmente através de
suas multinacionais, que atuam em vários setores da economia, inclusive no
de agricultura e alimentação. O Canadá é um grande exportador de grãos,
principalmente trigo e produtos de origem animal, como o leite e derivados.
Seus principais mercados são os EUA (principal comprador), Europa, Oceania
e Ásia.
A agricultura no PIB canadense
significa 3%, segundo dados da OMC, de um PIB de US$ 600 bilhões em 98.
4.2.1 Principais instrumentos de
política comercial no Canadá
Tarifas -
as tarifas canadenses são em média mais altas para os
produtos do reino animal e vegetal. As tarifas para o setor de alimentos,
bebidas e fumo podem variar entre 20% e 293%, dependendo do produto.
Produtos do reino animal possuem tarifas que variam de 57% a 341%. Existem
picos tarifários que chegam aos 315% para o leite e creme de leite, 252%
para as carnes, 325% para manteiga, entre outros.
Cotas tarifárias
- vários produtos agropecuários, como carnes, laticínios, ovos, produtos
alimentícios e bebidas das mais diversas contam com esse tipo de
instrumento.
Progressividade tarifária
- esse tipo de instrumento serve para que as tarifas aumentem conforme o
grau de elaboração dos produtos, sendo utilizado para inibir a importação
de produtos de maior valor agregado. Os produtos elaborados por vezes têm
tarifas duas vezes maiores que as suas respectivas matérias-primas. Os
alimentos e couros estão entre os produtos que sofrem esse tipo de prática
comercial. O Brasil é um país crítico as políticas de escalada tarifária,
que impedem que suas exportações de produtos industrializados ganhem maior
espaço no mercado internacional.
Tarifas específicas -
o Canadá também utiliza esse mecanismo para produtos de origem vegetal.
Tarifas sazonais
- o país utiliza para frutas, vegetais e flores, sendo permitida a
aplicação de tarifas sazonais por no máximo 46 semanas.
Sistema de preferências tarifárias
- o Canadá tem sistemas de preferências
tarifárias estabelecidos bilateralmente ou regionalmente. São mais
significativos os acordos decorrentes do NAFTA e com países menos
desenvolvidos. Chile, Nova Zelândia, Austrália e países do Caribe são
alguns exemplos de países que possuem políticas de preferência tarifária.
Licença de importação
- os canadenses tem especial rigor a respeito das licenças de importação,
principalmente para produtos alimentícios.
Requisitos de conteúdo local
- os canadenses também se utilizam de regulamentos que exigem que as
empresas locais utilizem proporções mínimas de matéria-prima local, como
forma de garantir mercado aos seus produtores.
Regulamentos Sanitários e
Fitossanitários - regulamento, assim como o
americano, bastante rigoroso, proibindo a importação de frutas e vegetais
a granel; proíbe a importação de carne bovina, suína e de frango em natura
do Brasil, sob alegação de contaminação com aftosa, apesar dos organismos
internacionais reconhecidos pela OMC recomendarem a carne brasileira.
Investimentos
- os investimentos de empresas estrangeiras em território canadense também
sofrem rigorosa análise de uma agência procurando verificar se os projetos
estão de acordo com a estratégia de planejamento do governo para o setor.
4.3 Chile
O Chile é um dos países com economia
agrícola ativa e exportações significativas. A média tarifária do país é
bastante baixa para os padrões latino-americanos, situando-se em torno de
11%. Esse, inclusive, é um dos entraves para uma maior integração do país
ao Mercosul, que trabalha com uma média tarifária mais elevada para sua
Tarifa Externa Comum. A participação da agricultura no PIB chileno é de
8%.
Os setores mais protegidos da
agricultura chilena são o açúcar, óleos vegetais e produtos lácteos. Em
termos de exportações o Chile comercializa com o Brasil vários produtos
agrícolas, especialmente vinhos e frutas.
4.3.1 Principais instrumentos de
proteção interna
Tarifas variáveis -
normalmente estabelecida através de bandas de preços para produtos
agrícolas, com o objetivo de estabilizar os preços no mercado interno
contra as oscilações mais bruscas ocorridas no mercado internacional.
Preferências tarifárias
- o Chile tem um acordo de preferências tarifárias com o Mercosul, por
conta de sua entrada como sócio do bloco. Um dos produtos brasileiros
beneficiados com o regime de preferências chileno é o café.
4.4 México
O México é um dos maiores
importadores de produtos agrícolas das Américas, ao mesmo tempo em que
ainda possui uma economia agrícola interna importante. A agricultura
mexicana foi uma das mais afetadas pelo NAFTA, perdendo espaço no mercado
internacional, mas principalmente perdendo espaço no seu próprio mercado
interno. O caso do milho mexicano é emblemático. Produto dos mais
importantes da agricultura do país, com forte carga cultural entre os
agricultores, o milho teve sua produção interna substituída em grande
medida pela produção norte americana. A participação da agricultura no PIB
mexicano é de 5%, para um PIB total de 600 bilhões em 98.
4.4.1 Principais instrumentos de
proteção interna
As tarifas mexicanas são
relativamente baixas, mas para certos produtos agrícolas elas são mais
elevadas. Destacam-se com tarifas de importação elevadas o fumo (45%),
cigarros (67%), produtos do reino animal (33 a 260%), produtos da
indústria alimentar e bebidas ( (19 a 141%).
Tarifas específicas
- entre os produtos de exportação brasileira que sofrem esse tipo de
tarifa estão o açúcar e o cacau.
Tarifas compostas
- são formadas por uma tarifa convencional acrescida de
uma tarifa específica, que podem levar a uma tarificação de mais de 120%
para alguns produtos, principalmente os agrícolas.
Tarifas sazonais
- o México também dispõe desse instrumento,
principalmente para a soja, sorgo.
Valoração aduaneira
- o país se utiliza desse instrumento quando os preços no mercado
internacional estão abaixo dos preços de referência, consolidados na OMC.
Nesse sentido, as tarifas são elevadas até o ponto de compensar os preços
do mercado interno em relação aos preços de referência.
Quotas tarifárias
- existem quotas para vários produtos agrícolas, entre
eles o frango, peru, queijo, feijão, trigo, cevada, milho, leite em pó,
cacau, café, entre outros. Algumas quotas chegam a ser leiloadas. Os EUA
são os principais beneficiários das cotas mexicanas. Embora o instrumento
não seja frequentemente utilizado, é prática mexicana negociar as
importações extra-cota sempre que julga necessário.
Anti-dumping e medidas
compensatórias - é um do países mais ativos
nesse tipo de política, tendo, inclusive, acionado o Brasil várias vezes.
Medidas Sanitárias e Fitossanitárias
- por estar integrado ao NAFTA, onde o rigor e a burocracia são grandes
para essas questões, o México também pratica discriminação em relação a
produtos brasileiros, como as carnes.
4.5 Brasil
O setor agroalimentar brasileiro
emprega diretamente perto de 17 milhões de trabalhadores na agricultura e
quase 750 mil no setor industrial.11 Isso significa que a cada quatro
trabalhadores ocupados um é desse setor. Não estão incluídos na soma o
número de trabalhadores no setor de serviços e que trabalham com
alimentação.
Segundo os dados do Censo
Agropecuário do IBGE - 95/96, apenas o número de estabelecimentos pode ser
calculado para cada produto, não sendo possível estabelecer o número de
pessoas ocupadas. De qualquer forma, a informação sobre o número de
estabelecimentos que se dedicam a cada uma das principais culturas do país
da uma idéia da importância de cada uma delas para o nível de emprego.12
A cultura com o maior número de
estabelecimentos é a de aves e ovos, com mais de 2,9 milhões. Milho é a
segunda cultura, com 2,5 milhões de estabelecimentos. São muito
importantes ainda o feijão (2,0 milhões), o leite (1,8 milhão), gado de
corte e suínos (cada um com 1,4 milhão) e o arroz (0,9 milhão). São
produtos importantes na balança comercial agrícola a soja, que é produzida
em 242 mil estabelecimentos, a cana de açúcar (377 mil) e o trigo, com
apenas 60 mil estabelecimentos dedicados a essa cultura.
No setor agroindustrial destaca-se o
beneficiamento de produtos vegetais, onde estão empregados mais de 290 mil
trabalhadores. O segmento de abate e preparação de carnes emprega perto de
230 mil pessoas. A indústria do açúcar emprega perto de 77 mil
trabalhadores e a de laticínios 55 mil.
O PIB agrícola brasileiro é de 8% em
relação aos US$ 780 bilhões que formavam o PIB total brasileiro em 98.
Contudo, esse valor corresponde apenas à agricultura, não incluindo dados
do setor agroindustrial e de serviços relacionados à alimentação. Estudos
apontam que todo o setor agroindustrial deve superar os 1/3 do PIB total
do país.
A balança comercial da agricultura e
agroindústria brasileira teve saldo positivo de US$ 13 bilhões em 2000,
segundo dados da SECEX/MDIC. Foram exportados quase US$ 20 bilhões e
importados perto de US$ 7 bilhões. Compõem esse desempenho setores
agrícolas, agroindustriais e outras indústrias, como a de madeira, papel e
celulose, couros e peles e calçados. Os setores com maior superávit são:
soja, café, calçados, madeira, celulose, carnes, além de açúcar, sucos,
fumo e tabaco. Os setores com maior déficit são: cereais, adubos e
fertilizantes, leite e derivados, indústria de moagem e hortaliças.
4.5.1 Principais instrumentos de proteção interna
Regime tarifário
O Brasil, por estar associado ao Mercosul, tem tarifas externas definidas
pelo bloco econômico, expressas pela TEC (Tarifa Externa Comum)13.
A atual média tarifária do bloco é de 20%, mas cada país tem direito de
listar 100 produtos que estariam em um regime de exceção a TEC. As tarifas
brasileiras para produtos agrícolas são relativamente baixas e com
diferenças menores entre os produtos do que as praticadas por outros
países. A menor tarifa é de 0%, sendo a maior de 27% segundo dados
apresentados pela CONAB14.
O Brasil tem consolidado na OMC
níveis tarifários bastante superiores aos utilizados na prática, embora
continue utilizando alguns instrumentos comuns no comércio internacional.
Progressividade tarifária
O Brasil também utiliza o
instrumento de elevar o nível tarifário conforme o grau de elaboração dos
produtos. Os produtos com maior nível de processamento têm tarifas de
importação maiores. A média tarifária geral do bloco é de 20%, mas entre
os produtos agrícolas e agroindustriais essa média é menor. A tarifas em
geral estão situadas na faixa de 8 a 14%, mas podem as maiores estão
próximas dos 30%, significando variações muito inferiores as verificadas
em seus concorrentes do norte.
Existem alguns grupos de produtos
que contam com tarifas um pouco mais elevadas. Um desses grupos é o
denominado por produtos e derivados de fibra natural, onde está situada a
cadeia têxtil do algodão. As tarifas variam de 0% para o fio até 20,5%
para o tecido. O setor de laticínios também conta com proteção e um dos
poucos em que a matéria-prima tem maior proteção que os produtos
processados. O leite em pó tem tarifa de 27%, enquanto que alguns
derivados entram com tarifas de 18,5%. O grupo de fumo e derivados também
conta com tarifas acima da média dos demais produtos agrícolas. Cigarros,
cigarrilhas e charutos contam com tarifas de 22,5% e a matéria-prima tem
tarifas de 16,5%.
Licença de importação
Esse tipo de mecanismo é utilizado,
entre outros motivos, para a importação de produtos agrícolas e
alimentares. Nem sempre seus objetivos tem sido o de defesa sanitária,
sendo objeto de várias queixas, inclusive dentro do Mercosul.
Medidas sanitárias
As medidas sanitárias e
fitossanitárias brasileiras relativas às importações não são rigorosas
como as adotadas por seus parceiros comerciais mais ricos. As disciplinas
são mais frouxas principalmente para produtos processados, com matéria-prima
importada. Os instrumentos de fiscalização não estão atualizados para
atuar com uma variedade tão grande de produtos importados. A própria
legislação nesse sentido não está devidamente atualizada. Não é uma
característica da atuação governamental a defesa dos interesses dos
consumidores nas negociações internacionais.
Políticas de apoio interno
O Brasil tem atuado de forma mais
ativa na defesa de setores econômicos com maior poder de pressão. Painéis,
medidas compensatórias, elevação de tarifas de produtos sensíveis,
restrições não comerciais, créditos a exportação, entre outras também são
utilizadas pelo governo brasileiro.
O Brasil historicamente tem
subsidiado os investimentos e créditos em geral para segmentos da
agricultura. Atualmente contam com subsídios diretos do Tesouro perto R$
18 bilhões, disponibilizados para a safra 2001/0215. Esses recursos são enquadrados dentro do conceito da Caixa Verde da OMC,
não sendo considerados deformadores do comércio e, por tanto, não sujeitos
a compromissos de redução de gastos.
Políticas de sustentação de preços
O Brasil aplica volumes cada vez
mais insignificantes na sustentação de preços no mercado. A Política de
Garantia de Preços Mínimos e estoques reguladores está praticamente
desativada, substituídas por outros instrumentos de interferência nas
grandes negociações, como leilões e prêmios.
Os gastos com pesquisa, infra-estrutura,
pagamentos diretos, desenvolvimento, etc. existem no país a muito tempo.
Nas últimas décadas esse tipo de política tem sido orientada pelo modelo
de agricultura conhecido como revolução verde. De forma ainda embrionária,
algumas políticas começam a ser desenvolvidas para a agricultura familiar,
como o Pronaf. Essas políticas, segundo o governo, não estariam em
negociação.
5) As negociações sobre agricultura
na ALCA
5.1 Principais Atores e interesses
As negociações sobre agricultura na
ALCA são as mais visíveis aos olhos da opinião pública, principalmente no
Brasil. O governo e a mídia têm dado especial atenção ao tema,
prevalecendo uma visão de que a postura brasileira é bastante crítica nas
negociações. Em certas declarações governamentais, avanços em agricultura
são considerações pré-condição para a assinatura do acordo. No campo das
negociações agrícolas da ALCA, três grupos destacam-se: os EUA, juntamente
com o Canadá; os países do Mercosul e da Comunidade Andina; os países de
economias menores, na medida em que representam uma grande quantidade de
países dentro de um sistema de negociações que decide pelo consenso.
Nesta análise serão destacados os
interesses e posicionamentos dos dois principais negociadores em
agricultura, os EUA e Brasil.
5.1.1 EUA
Os temas de maior interesse dos
americanos não estão entre os temas sob responsabilidade do grupo de
negociações sobre agricultura. Ao contrário, o grupo de agricultura tende
a tocar em assuntos que os americanos não gostariam de tratar na ALCA e às
vezes nem na OMC.
Os temas de maior interesse
americano são os investimentos, serviços, propriedade intelectual e
comércio eletrônico.
Com relação aos temas sob
responsabilidade do grupo de agricultura especificamente, os interesses
americanos estão direcionados a abertura de novos mercados para seus
produtos através da redução de tarifas no continente, especialmente na
América Latina, onde elas são, em média, mais elevadas.
Biotecnologia, outro tema
relacionado diretamente a agricultura, é tratado com mais especificidade
no grupo de negociações sobre propriedade intelectual. O grupo de
agricultura poderia atuar sobre o tema da biotecnologia através das
discussões sobre questões sanitárias e fitossanitárias, como têm feito os
europeus, mas esse tipo de resistência não tem sido muito observado no
posicionamento oficial dos países da região. A princípio existem poucas
resistências a liberalização do comércio desse tipo de mercadoria na ALCA.
Entre os temas sensíveis para os
americanos destacam-se: ajuda interna, créditos à exportação, medidas
anti-dumping, ajuda alimentar, cotas tarifárias, restrições sanitárias e
fitossanitárias.
Com relação às críticas recebidas
pelos americanos sobre as políticas de ajuda interna geradoras de
distorção pela OMC, a resposta é que as negociações devem ocorrer na OMC,
onde os países que praticam com maior intensidade essas políticas,
especialmente os da União Européia e Japão, podem se comprometer com algum
tipo adicional de disciplina. Para os americanos tratar isso apenas no
âmbito da ALCA significaria deixar os europeus agirem sozinhos no comércio
internacional. Ou seja, há um condicionamento proposto pelos americanos de
que só aceitariam discutir a eliminação ou redução dos gastos com
políticas de apoio interno no espaço da OMC.
Com relação às políticas de créditos
e seguros a exportação à situação é a mesma. Os EUA acusam os europeus de
subsidiarem suas exportações e afirmar que os seus instrumentos seriam uma
forma de sobrevivência no mercado internacional, também não podendo
assumir compromissos de eliminação ou redução do uso desses instrumentos
no âmbito da ALCA.
Já as políticas de ajuda alimentar,
que são utilizadas pelos americanos como instrumento de promoção do
escoamento da produção agrícola não existe um posicionamento muito claro
de até que ponto os americanos aceitarão tratar desse assunto na ALCA.
A política de quotas deve ser
defendida na ALCA pelos americanos, que aceitariam no máximo algumas
concessões pontuais sobre o tema, não permitindo o avanço da idéia da
eliminação progressiva do regime de quotas.
Para os EUA, como visto acima,
interessa discutir tarifas. A América Latina é um espaço de tarifas médias
mais elevadas que outras regiões, o que tem impedido de certa forma a
expansão do comércio americano na região. Discutir tarifas também é
bastante conveniente para este país na medida em que as suas tarifas não
são altas, sendo utilizados outros mecanismos não tarifários, como visto
anteriormente.
Com relação às medidas sanitárias e
fitossanitárias, a tendência é não ocorrer grandes divergências entre os
países, prevalecendo a diversidade de situações no interior do bloco. Os
sistemas complexos, burocráticos e protecionistas dos americanos devem
continuar existindo. Sobre isso há uma problemática pouco explorada nas
negociações. Muitas vezes, as medidas sanitárias são utilizadas como
instrumento para a imposição de determinados processos produtivos e
padrões tecnológicos. Isso ocorre tanto no comércio entre as nações, como
também internamente aos países. No Brasil essa questão é bastante visível
na discussão da regulamentação da produção de leite16. Isso significa que
essa discussão no âmbito da ALCA pode tomar uma dimensão maior na medida
em que novas exigências podem ser impostas sob a desculpa da exportação
para esses países. A adequação ao modelo sanitário americano pode
significar a exclusão de processos e padrões tecnológicos incompatíveis
com as suas exigências. Ou seja, o Brasil corre o risco de ter que
internalizar muitas das exigências estabelecidas por outros países com os
quais comercializamos.
Em conclusão pode-se dizer que os
americanos vão enfrentar dificuldades para fechar o acordo agrícola na
ALCA e por consequência o próprio acordo, dado que não serão consideradas
encerradas as negociações enquanto todos os grupos não encerrarem seus
trabalhos.
Outra dificuldade do governo
americano é a não obtenção do novo fast track, onde o Congresso
continua mantendo seu poder de veto e alteração das negociações acertadas
pelo executivo. Sem este mecanismo, o governo americano não pode dar
garantias de que os acordos aprovados serão ratificados pelo Congresso do
país.
5.1.2 Brasil
A participação do Brasil nas
negociações da ALCA tem sido marcada pela prioridade nas negociações
agrícolas. Não têm sido divulgados, nem trabalhados na opinião pública os
objetivos do Brasil nos demais temas em negociação. Isso é bastante ruim
na medida em que os demais acordos, principalmente os de investimento,
serviços e propriedade intelectual também tem grande importância para a
economia brasileira. O governo brasileiro, inclusive, constantemente emite
sinais de que sua moeda de troca é de fato a agricultura e que se não
forem feitas concessões importantes nesse tema, os demais não serão
negociados. O inverso da frase é o mais perigoso porque significa que ao
fazerem concessões em agricultura o Brasil faria nos demais temas.
Setores da indústria apresentam-se
muito resistentes em aderir a ALCA na forma como está. Outros setores, que
visualizam possibilidades e oportunidades manifestam-se em favor do acordo,
com ajustes.
Em relação à agricultura, as
posições governamentais concentram-se basicamente em quatro grandes
conjuntos de questões: i) acesso a mercados; ii) subsídios, créditos e
seguros à exportação; iii) medidas antidumping e salvaguardas especiais;
iv) políticas de ajuda interna que distorcem o comércio.
No primeiro tópico, os interesses
dos negociadores brasileiros estão direcionados para a redução e/ou
eliminação das barreiras tarifárias e não tarifárias, principalmente as
encontradas no mercado americano. Nesse sentido criticam as políticas de
quotas tarifárias, a escalada tarifária e as medidas sanitárias que servem
de instrumento de proteção.
Com relação ao item dois, o
principal foco da atuação brasileira é definir o que são os créditos e
seguros à exportação e um cronograma de eliminação do mecanismo. O governo
americano pretende discutir essas questões no âmbito da OMC. Já no item
três, o governo brasileiro quer critérios mais específicos para a
utilização dos mecanismos de anti-dumping, para que ele não seja utilizado
de forma arbitrária ou para fins de defesa comercial pelos países do bloco.
No item quatro a preocupação é estabelecer novos critérios para julgamento
do que seriam políticas que distorcem o comércio ou não. O governo
brasileiro tem proposto que sejam assumidos compromissos nessa área, mas
os americanos também jogam para a OMC a solução do problema.
São temas sensíveis para o governo
brasileiro, entre outros, a vinculação de questões ambientais e
trabalhistas relacionadas ao comércio, a redução de tarifas sem
contrapartidas concretas de acesso a mercados nos principais países da
região.
6) As negociações na ALCA
6.1 Estrutura das negociações
As negociações sobre agricultura
estão dentro da lógica geral de tomada de decisões e condução das
negociações do acordo. A estrutura tem no seu topo a Reunião Ministerial,
onde são ratificadas as decisões finais sobre as negociações. Representam
os países nessas reuniões os ministros responsáveis pelo comércio. Abaixo
da cúpula ministerial está o CNC (Comitê de Negociações Comerciais),
responsável por coordenar e dar coerência aos acordos negociados nos
Grupos de Negociações. Esses grupos, por sua vez, fazem de fato as
negociações e o acerto preliminar de consensos. Existem ainda os grupos
consultivos: Grupo Consultivo sobre Economias Menores, Comitê Conjunto
sobre Comércio Eletrônico, Comitê de Representantes Governamentais para a
Sociedade Civil.
6.2 As Reuniões Ministeriais
Antes de trabalhar com mais detalhes
as negociações do GNAG (Grupo de Negociações sobre Agricultura), é
importante analisar a evolução do tema agricultura nos documentos das
instâncias superiores. Serão analisados os documentos das cúpulas
presidenciais e dos ministros de comércio.
Nesses encontros são emitidas
declarações oficiais, cartas de princípios e planos de ação.
Nas primeiras declarações oficiais,
tanto dos Chefes de Estado, quanto dos ministros, as discussões em torno
da agricultura e do desenvolvimento rural praticamente não eram citadas.
Em 1994, nos documentos da Cúpula de Miami, encontra-se alguma referência
a agricultura e ao rural apenas no Plano de Ação, no sentido de expressar
um dos objetivos gerais da ALCA, que é maximizar a abertura em agricultura.
A declaração ministerial de 1996
propõe a criação de um banco de dados sobre agricultura e a identificação
de outras medidas que distorcem o comércio, além dos subsídios,
anti-dumping e direitos compensatórios. O banco de dados ainda não está
disponível, publicamente ao menos. Com relação ao meio rural essa
declaração não faz nenhuma referência.
Em 1997, o tema não é citado na
declaração ministerial. Somente em 1998, quando oficialmente foi criado o
Grupo de Negociações sobre Agricultura (GNAG) é que aprofunda-se um pouco
mais sobre o tema. A cúpula ministerial estabeleceu a primeira presidência
das negociações agrícolas (Argentina), as relações entre agricultura e
acesso a mercados e os objetivos do Grupo de Negociações sobre Agricultura,
o que será visto com mais detalhes adiante.
Em 1999, os ministros cobram
providências sobre a interação entre os temas agricultura e acesso a
mercados, estabelecem algumas referências para atuação conjunta na OMC,
principalmente sobre os temas relacionados à ajuda interna e subsídios a
exportação, além de firmar posição em favor do cumprimento do acordo
agrícola do GATT. Outros temas que distorcem o comércio e que ainda não
estão em negociações na OMC também foram levados para este fórum a partir
da ALCA. Nesta reunião definiu-se o Brasil como presidência do Grupo de
Negociações sobre Agricultura da ALCA.
A Cúpula das Américas e a reunião
ministerial de 2001 foram as que mais avançaram na temática agricultura e
desenvolvimento rural. Até então, apenas algumas referências eram feitas
ao tema. A declaração conjunta dos Chefes de Estado vincula a melhoria da
agricultura e da vida rural como pré-requisito fundamental para a redução
da pobreza na região. O Plano de Ação, aprovado pelos Chefes de Estado vai
mais longe, incorporando vários conceitos e reivindicações antes presentes
apenas nos documentos das organizações da sociedade civil. Os capítulos 9º
“Bases Ambientais para o Desenvolvimento Sustentável” e 10º “Gestão
Agrícola e Desenvolvimento Rural” abordam a temática. A seguir as
principais definições desses dois capítulos:
No Capítulo 9 são estabelecidos
princípios para uma boa gestão ambiental dos recursos naturais, propondo a
observância dos acordos multilaterais sobre o assunto, como os relativos a
Agenda 21. Existem diferenças de posicionamento entre os países sobre essa
questão, já que os EUA não assinaram alguns dos mais importantes acordos
nessa área. Há referências também em relação à produção limpa, a
preservação de plantas e animais, além de defender uma gestão sustentável
das florestas do continente.
No Capítulo 10 o Plano de Ação
reconhece a agricultura como meio de vida de milhões de habitantes e setor
estratégico para a geração da prosperidade sócio-econômica do continente.
Pela primeira vez são expressas preocupações com o desenvolvimento do meio
rural, propondo a articulação dos órgãos de Estado e sociedade civil para
construção de políticas visando o desenvolvimento sustentável da
agricultura e do meio rural no médio e longo prazo.
Há também uma preocupação com o
fortalecimento e a construção de políticas que preservem e estimulem as
pequenas empresas rurais, devendo-se promover, inclusive, um ambiente
favorável a esse tipo de empreendimento por parte dos governos.
O documento também prega o estímulo
ao desenvolvimento de mercados para produtos obtidos através do uso
sustentável dos recursos naturais.
A Declaração Ministerial de abril de
2001 também avança na temática e estabelece prazos para definições mais
objetivas a respeito das negociações agrícolas. Contudo, essas definições
são relativas apenas a temas comerciais. Entre as principais definições da
cúpula ministerial de 2001 estão:
Acesso a Mercados
-
Liberalização e proteção ambiental devem caminhar
juntas;
-
O Comitê de Negociações Comercias, juntamente como o
Grupo de Agricultura devem propor recomendações sobre métodos e
modalidades para a negociação tarifária até 1º de abril de 2002 e iniciar
negociações até 15 de maio do mesmo ano;
-
Acelerar identificação das medidas não tarifárias até
1º de abril de 2002;
-
A constituição de um bando de dados sobre agricultura
até novembro de 2001;
-
A definição
de um regime de salvaguardas até abril de 2002;
Agricultura
-
Até 1º de abril de 2002 propor métodos e modalidades
de negociação tarifária;
-
Até 1º de abril de 2002 apresentar metodologia e
alcance para eliminação dos subsídios à exportação;
-
Até 1º de abril de 2002 recomendações sobre métodos
para disciplinas para o tratamento de todas as práticas que distorçam o
comércio, incluindo aquelas com efeito equivalente aos subsídios à
exportação;
-
Até 1º de abril de 2002 identificar medidas não
tarifárias, organizar um inventário para elas e apontar cronograma e
metodologia para tratamento dessas questões;
-
Até 1º de abril de 2002 notificar e contranotificar
as medidas sanitárias e fitossanitárias, recomendando tratamento para
evitar que esse tipo de política seja adotado como barreira comercial;
-
Até 1º de
abril de 2002 para subsídios, antidumping e direitos compensatórios, se
for o caso, deve-se propor aprofundamento de possíveis medidas para
acordos além do que já está estabelecido na OMC.
6.3 O Grupo de Negociações sobre
Agricultura (GNAG)
O Grupo de Negociações sobre
Agricultura na ALCA foi constituído em 1998 e desde então já passou por
três presidências: Argentina, Brasil e Guatemala.
Atualmente é presidido pela
Guatemala, sendo a Vice-Presidência do Uruguai. Desde sua criação já foram
realizadas 14 reuniões do grupo, sendo a última nos dias 15 a 19 de
outubro de 2001. Ainda no mês de dezembro deve ocorrer a próxima reunião
do grupo.
As diretrizes do CNC para o Grupo
Negociador sobre Agricultura (GNAG) acolheram, na sua totalidade, a
proposta do Mercosul calcada, por sua vez, nos aportes do Brasil e da
Argentina.
O programa de trabalho acordado
cobre as áreas-chave para o comércio agrícola, a saber:
-
Acesso a mercados (tarifas e medidas não tarifárias);
-
Subsídios às exportações e;
-
Outras medidas que podem distorcer significativamente
esse comércio.
-
O CNC
decidiu, ainda, concentrar no programa do GNAG, todas as tarefas
relacionadas com a aplicação de medidas sanitárias e não sanitárias (acordo
sobre SPS da OMC).
Os países do Mercosul têm mantido
encontros de coordenação prévios a todas as reuniões do GNAG, além de
várias reuniões com outros blocos e países.
Com o intuito de estabelecer um
campo de interação com órgãos governamentais, entidades sindicais e
patronais e com a sociedade em geral o governo brasileiro criou, em
outubro de 1996, a Seção Nacional de Coordenação dos Assuntos Relativos a
ALCA, SENALCA, órgão colegiado que se reúne periodicamente, com a
finalidade de preparar as posições brasileiras para as negociações da ALCA.
No Brasil, além da SENALCA, que
discute o acordo em termos mais gerais, o governo brasileiro constituiu um
grupo de trabalho, uma Coordenação Nacional para o GNAG da ALCA. Nesse
espaço são definidas as posições que o governo brasileiro leva para o
Mercosul e para a ALCA. Esse grupo é coordenado por Maria Izabel Vieira do
MRE (Ministério das Relações Exteriores) e vem realizando reuniões
periódicas com representantes governamentais, de diferentes ministérios,
especialmente do Ministério da Agricultura, Meio Ambinete, Desenvolvimento
Agrário, Saúde, Indústria, Comércio e Turismo, representantes da sociedade
civil e do setor empresarial, como CONTAG, CNA, OCB e a Comissão de
Agricultura da Câmara dos Deputados.
Entre os principais objetivos
estabelecidos para o GNAG estão:
Objetivos
(Declaração Ministerial de São José):
-
Os objetivos do Grupo de Negociação sobre Acesso a
Mercados deverão ser aplicados ao comércio de produtos agrícolas. Os temas
de regras de origem, procedimentos aduaneiros e barreiras técnicas ao
comércio serão tratados no Grupo de Negociação sobre Acesso a Mercados.
-
Assegurar que as medidas sanitárias e fitossanitárias
não sejam aplicadas de maneira a constituírem um meio de discriminação
arbitrária ou injustificável entre países ou uma restrição disfarçada ao
comércio internacional, com vistas a prevenir as práticas comerciais
protecionistas e facilitar o comércio no hemisfério. De modo congruente
com o Acordo sobre Medidas Sanitárias e Fitossanittárias da OMC (Acordo
MSF), tais medidas serão aplicadas apenas para obter o nível adequado de
proteção da saúde e vida humana, animal e vegetal, estarão fundamentadas
em princípios científicos e não serão mantidas sem suficiente base
científica. As negociações nesta área abrangem a identificação e o
desenvolvimento de medidas necessárias para facilitar o comércio,
respeitando e examinando com profundidade as disposições contidas no
Acordo MSF da OMC.
-
Eliminar os subsídios às exportações agrícolas que
afetem o comércio no hemisfério.
-
Identificar, e submeter a maior disciplina, outras
práticas que distorçam o comércio de produtos agrícolas, inclusive aquelas
que tenham efeito equivalente ao dos subsídios às exportações agrícolas.
-
A cobertura dos produtos agrícolas será aquela
referida no Anexo I do Acordo sobre Agricultura da OMC.
-
Incorporar
os progressos alcançados nas negociações multilaterais sobre agricultura
que se realizarão em conformidade com o Artigo 20 do Acordo sobre
Agricultura, bem como o resultado das revisões dos Acordos MSF da OMC17.
Até o momento foram realizadas 14
reuniões do GNAG, sendo estabelecido um primeiro rascunho do acordo
agrícola da ALCA. O acordo ainda é um texto retalhado de colchetes, que
indicam diferentes redações para um mesmo artigo ou seção. Ou seja, ainda
não existe uma indicação mais concreta de que tipo de acordo vai ser
assinado e nem de sua abrangência.
As principais delegações
negociadoras são as do Mercosul, principalmente Brasil e Argentina, e a
dos EUA. As divergências entre esses dois principais blocos no continente
se expressam nas deferentes redações que o acordo possui atualmente.
6.4 O Acordo Agrícola da ALCA
A atual versão do Acordo Agrícola da
ALCA conta com 22 Artigos, organizados em seis seções e sete anexos.
A seguir tenta-se descrever
brevemente o que seria o índice do acordo, já que até mesmo os títulos e
tópicos ainda estão dentro de colchetes. Além disso, são feitos alguns
comentários sobre a abrangência dos principais tópicos18.
Seção 1 - Trata das disposições
gerais do Acordo, contendo dois artigos em que são apresentados o alcance
e cobertura das negociações, a incorporação imediata dos acordos da OMC no
acordo regional, a prevalecência das decisões em agricultura sobre outros
capítulos que tratam do tema e disposições sobre as economias menores.
Seção 2 - Trata de Acesso a Mercados,
contendo cinco artigos:
-
Art 3 - estabelece regras para o tratamento quanto à
nacionalidade dos produtos, com o objetivo de dar as mesmas condições para
produtos nacionais e dos parceiros do bloco;
-
Art 4 - com vários sub-itens procura definir regras
sobre tarifas, sua redução, ou eliminação, os cronogramas e as bases para
a desgravação tarifária; a disciplina ou proibição de certas políticas
tarifárias, como a banda de preços, impostos de exportação; relação das
medidas com acordos bilaterais ou regionais, exceções, etc.
-
Art 5 - estabelece regras para medidas não tarifárias,
contendo divergências sobre que tipo de medidas serão objeto de acordos;
-
Art 6 - estabelece indicações de atuação mais ou
menos conjunta na OMC e para a incorporação das decisões nesse fórum no
acordo da ALCA;
-
Art 7 -
estabelece indicações para a disciplina relativa as políticas de
savaguarda especial para agricultura, contendo divergências sobre a
eliminação ou não dos mecanismos de salvaguardas, além de dar tratamento
diferenciado sobre a questão para as economias menores.
Seção 3 - Trata de Subsídios à
Exportação e é um dos trechos em que aparecem as maiores divergências do
acordo. Contem cinco artigos relacionados a seguir:
-
Art 8 - propõe identificação e definição do que é
subsídio à exportação. Há divergências quanto à abrangência da
classificação dos subsídios, onde um grupo de países propõe que seja a
mesma da OMC, enquanto que outros países propõem que a abrangência
ultrapasse as definições da OMC. Há também indicação para que não seja
considerado subsídio a exportação os créditos e seguros à exportação, uma
reivindicação nítida dos EUA, contra os interesses negociadores do
Mercosul
-
Art 9 - Propõe definições sobre a eliminação dos
subsídios à exportação, sendo que uma versão do acordo propõe que medidas
sejam tomadas nesse sentido ainda na ALCA, enquanto que outra prega a
eliminação multilateral dos mecanismos de subsídio à exportação, através
da OMC. Aqui as divergências são também entre americanos (NAFTA) e
brasileiros (Mercosul). O artigo possui uma série de sub-itens que
procuram estabelecer formas de reconhecimento da distorção causada pelos
subsídios, regras contra países extra-bloco que praticam esse tipo de
política, entre outras políticas como a eliminação da cláusula de paz em
relação aos subsídios à exportação e o tratamento diferenciado para as
economias menores;
-
Art 10 - trata das importações de países extra-bloco
que subsidiam seus produtos na origem;
-
Art 11 - propõe disciplinas sobre produtos
subsidiados por países extra-bloco e que concorrem com exportações de
países do bloco em terceiros mercados;
-
Art 12 -
estabelece definições sobre outras medidas e práticas de efeito
equivalente aos subsídios à exportação
Seção 4 - Defini outras medidas e
práticas que causam distorções no comércio e na produção. Contem três
artigos com vários trechos divergentes. Aqui novamente as posições dos
negociadores do Mercosul e dos EUA entram em conflito.
-
Art 13 - trata das Medidas de Ajuda Interna,
reconhecendo o potencial de distorção do comércio que esse tipo de medida
causa. A principal divergência está na intenção de delegar para a OMC a
disciplina desse tipo de política. Essa intenção parte principalmente dos
EUA contra a vontade dos países do Mercosul, que defendem algum tipo de
disciplina no âmbito da ALCA. As medidas consideradas de ajuda interna
contam com várias definições no rascunho do acordo, sendo que a maioria
delas adota a metodologia dos compartimentos verde, amarelo e vermelho da
OMC. Existem propostas que apontam para novas definições, inclusive, do
que seria considerado caixa verde, ou seja, quais as políticas que
estariam livres de compromissos de redução. O acordo, sem consenso,
estabelece quais políticas seriam consideradas permitidas, ou legítimas;
-
Art 14 - estabelece normas para os impostos a
exportação, incluindo aspectos como a redução das diferenças entre
produtos primários e processados, entre outras medidas;
-
Art 15 -
Trata de disciplinas para empresas estatais de comércio, propondo a
eliminação dos direitos de exclusividade de exportação e o repasse de
recursos públicos, empréstimos ou garantias por parte do Estado para essas
empresas. Ou seja, procura impedir privilégios em termos de facilidades de
concorrência por parte de empresas estatais.
Seção 5 - Medidas Sanitárias e
Fitossanitárias - também capítulo dos mais polêmicos, procura estabelecer
disciplinas que impeçam a utilização de mecanismos de defesa comercial
travestidos de medidas sanitárias ou fitossanitárias. Esta Seção contem
cinco artigos, com uma infinidade de sub-itens que a transformam na maior
de todas a seções do acordo agrícola da ALCA. Aqui também surgem várias
divergências entre os principais atores. Há uma nítida preocupação por
parte dos países do Mercosul contra as políticas extremamente rigorosas
adotadas pelos países do Norte, especialmente pelos americanos.
-
Art 16 - este artigo tem dois títulos, em que um
deles avança no escopo do acordo, propondo que sejam estabelecidas as
disposições gerais, direitos e obrigações das partes, enquanto que a outra
redação propõe apenas definições. O artigo procura estabelecer bases
mínimas que devem ser respeitadas, partindo das definições acordadas na
OMC, mas propõe também a adoção de critérios de outras instituições
internacionais ou regionais. O grande desafio do artigo para os países do
Mercosul é facilitar o comércio, enquanto que das nações do Norte o
desafio é permitir a continuidade de seus sistemas de inspeção rigorosos
das importações de origem animal e vegetal.
-
Art 17 - procura definir regras para a implementação
no âmbito da ALCA dos acordos acertados na OMC sobre o assunto e procura
definir regras para o estabelecimento de equivalências entre as diferentes
regras das partes e transparência das regras internas de cada país;
-
Art 18 - trata de assistência técnica e cooperação
relativas ao estabelecimento de regras mais harmônicas para medidas
sanitárias e fitossanitárias, controles de pragas, aparato institucional e
infraestrutura operacional e técnica, além de outras definições.
-
Art 19 - o artigo tem dois títulos, sendo um o
estabelecimento de regras para consultas e outro o estabelecimento de
disciplinas para a solução de controvérsias;
-
Art 20 -
estabelece o aparato institucional responsável pelo tema e o foro em que
serão discutidas as divergências entre as partes, além de acompanhar e
implementação do acordo e propor adequações;
7) Conclusões
O Brasil é um dos países em que a
opinião pública e as organizações da sociedade civil mais debatem o
assunto ALCA, especialmente agricultura. Também não deve ser deixado sem o
devido reconhecimento o processo de abertura dos negociadores do governo
brasileiro às organizações sociais, ainda que em nível muito abaixo do
desejado. Porém, quando comparamos com outros países, a postura do governo
brasileiro tem sido mais aberta à participação da sociedade.
Nas reuniões da SENALCA (Seção
Nacional de Coordenação dos Assuntos Relativos À Área de Livre Comércio
das Américas) que já foram pelo menos 30, muito se tem discutido sobre o
melhor posicionamento brasileiro, contando com a participação de inúmeras
organizações governamentais e não governamentais. Entre as organizações
sociais e ong’s participantes destacam-se as centrais sindicais, a Contag,
a FASE, Action Aid, entre outras.
Tudo isso não significa que a
participação brasileira nas negociações tenha sido a desejada tanto em
termos mais gerais como também em relação à agricultura, onde
aparentemente a postura brasileira tem sido bastante crítica em relação à
grande potência do continente, os EUA.
Para muitos movimentos, intelectuais
e particos ainda não estão claras quais as possíveis vantagens e
desvantagens desse acordo. Rubens Barbosa, Embaixador do Brasil em
Washington e ex-coordenador do Brasil no Mercosul alerta “Não há ainda uma
idéia clara das vantagens e desvantagens para a economia brasileira,
porque inexistem estudos técnicos que discutam em profundidade e com
objetividade os efeitos da liberalização comercial ampliada sobre o setor
industrial e do agronegócio (...), menos ainda sobre serviços, políticas
públicas e investimentos”.
Lia Yalls Pereira, economista da FGV19
alerta que os acordos não se restringem à liberalização tarifária e que é
muito difícil prever os impactos desse tipo de integração. Ela aponta
também que um acordo com a União Européia poderia trazer mais benefícios
do que com os EUA. Com os EUA haveria, inclusive, risco de redução do PIB
industrial brasileiro. A economia brasileira, segundo Lia, poderia se
transformar numa grande “maquiladora”, como ocorreu com o México.
Para Coutinho e Furtado20, “a abertura
comercial produziu pelo lado das importações efeitos quantitativos muito
além dos previstos, sem no entanto propiciar (...) os efeitos qualitativos
que lhe foram atribuídos”. Os autores dizem também que “a abertura
unilateral da economia brasileira aos fluxos de comércio mundiais não foi
acompanhada por uma ampliação correspondente dos mercados de destino dos
produtos brasileiros”. Dizem ainda “se o ritmo da abertura e o formato da
estabilização produziram grandes transformações e perturbações, nem uma
nem outra se revelam suficientes para dotar a economia duma trajetória
dinâmica e sustentável, capaz de propiciar o crescimento duradouro e abrir
novas oportunidades inovadoras de desenvolvimento”.
Para esses autores são fundamentais
observar as seguintes questões quando objetiva-se obter vantagens em
processos de integração comercial:
-
Desenvolvimento de empresas e grupos empresariais
fortes, de grande porte, capazes de atuar globalmente;
-
Desenvolvimento de novas especializações competitivas
em setores de alto valor agregado, o que pressupõe o acúmulo de
capacitação tecnológica e a formação de núcleos endógenos de inovação nos
sistemas empresariais;
-
Habilitação
do Estado na implementação das políticas contemporâneas de proteção contra
o comércio desleal, regulação dos monopólios e da concorrência, permitindo
a instituição de trajetórias produtivas dinâmicas e sustentadas.
Como pode-se observar, o Brasil não
está bem posicionado em nenhum dos pré-requisitos citados.
Com relação às negociações sobre
agricultura, o país, não somente o governo, ainda tem muito que avançar no
sentido de compreender melhor quais seriam realmente os mais importantes
interesses brasileiros que deveriam ser defendidos nas negociações.
É um desafio para esse governo e
para a sociedade em geral atuar nas negociações internacionais levando em
consideração não apenas a discussão de acesso a mercados, mas sim os
interesses de um país que possui uma importante economia agrícola.
Essa economia agrícola emprega 25%
da PEA, ou 18 milhões de trabalhadores, segundo dados oficiais, mais de
80% em regime familiar. Essa agricultura trabalha sobre um dos mais ricos
ecossistemas do planeta, exigindo preocupações mais abrangentes que apenas
a produção agrícola. A biodiversidade e os recursos naturais que possuímos
formam um patrimônio que é também econômico e precisa ser defendido nas
negociações comerciais. Agricultura também viabiliza mais de 75% dos
municípios do país, contribuindo com a arrecadação e com a economia local.
A agricultura brasileira, quando baseada na produção familiar, contribui
também para a ocupação mais equilibrada do território nacional, sendo
responsável, em certa media, também pela dinamização da economia urbana.
Além disso, há que se refletir se o
país está levando em consideração nas negociações sobre agricultura outras
preocupações. Como estão sendo tratadas as questões referentes às
economias ajusante e a montante da agricultura. Como estão sendo tratadas
nas negociações os interesses referentes ao modelo tecnológico e a
produção dos insumos para a agricultura. Vamos aprofundar nossa
dependência tecnológica ou vamos abrir caminho para a construção de maior
autonomia nessa área. Da mesma forma em relação ao controle/coordenação/planejamento
das cadeias agroindustriais do país. Até que ponto as negociações levarão
a uma maior desnacionalização do setor e a imposição de novas barreiras à
entrada de empreendedores nacionais. Os processos anteriores de abertura
já causaram estragos enormes nessa área.
Até que ponto as negociações não nos
levarão a ter que internalizar práticas sanitárias e fitossanitárias
excludentes, travestidas de preocupações com a qualidade dos alimentos,
mas que servirão para excluir, concentrar e estabelecer barreiras à
entrada de nossos próprios produtores e empreendedores no mercado
agroalimentar e agroindustrial.
As negociações sobre agricultura não
podem de maneira alguma ser restritas a lógica de acesso a mercados e aos
interesses exclusivos dos exportadores e importadores. As declarações de
cúpula já incorporaram outras preocupações, assumindo compromissos que vão
além da discussão tarifária e de políticas comerciais. Os Chefes de Estado,
reunidos no Canadá declararam que a agricultura e o meio rural são
fundamentais para o combate a pobreza na região e para o desenvolvimento
sustentável dos países.
Para Ricardo Markwald, diretor da
Funcex, a possibilidade de não adesão brasileira a ALCA deve ser levada em
consideração, caso as vantagens para o país não sejam as esperadas. Os
riscos de exclusão envolvidos numa eventual desistência da participação
brasileira na ALCA não levaram ao fechamento do mercado hemisfério para
nossas exportações. 50% do comércio brasileiro total e mais do que isso
para o agrícola vão para EUA e União Européia, países com os quais não
temos relações de preferência comercial. Esse quadro não se alteraria com
o Brasil estando fora da ALCA.
A OIT (Organização Internacional do
Trabalho) manifestou-se sobre os possíveis impactos do globalização e da
integração regional para os trabalhadores do campo. Segundo Vali Jamal21 ,
citando relatório da OIT, metade dos habitantes do Nordeste deve migrar
para grandes cidades da região e depois para o Sudeste devido aos impactos
da globalização e da integração regional. As causas seriam a péssima
remuneração do trabalho no campo, o modelo tecnológico intensivo em
capital e o apoio exclusivo à produção de commodities.
O Brasil precisa formular melhor e
tornar claro para a sociedade qual é o seu projeto para a agricultura e
para o meio rural brasileiro. Somente a partir desse projeto é que as
posições brasileiras poderão ter mais consistência e legitimidade.
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vai crescer no Brasil, prevê OIT, in artigos da ALCA -.
Via Campesina - Soberania
Alimentaria y Comércio Internacional, Analisis y Posiciones,
novembro de 2001.
1 Todos os documentos oficiais dos acordos
firmados para a construção da ALCA podem ser acessados pela internet
através da página da ALDA:
www.ftaa-alca.org .
2 Em “Alca, um acordo inaceitável”, trabalho
apresentado no seminário Emprego e Desenvolvimento Tecnológico, organizado
pelo Dieese, Cesite e CNPQ, setembro de 1998.
3 Em texto base aprovado para o 8º Congresso
da entidade, realizado em março de 2001.
4 Organização internacional composta por
organizações de agricultores com postura bastante dura contra os efeitos
da globalização sobre a agricultura.
5 A Frente Sul da Agricultura Familiar é uma
organização que reúne sindicatos, cooperativas, associações e ong’s da
região Sul. Maiores informações sobre a Frente Sul da Agricultura Familiar
podem ser encontradas na página do deser: www.deser.org.br.
6 Maiores informações sobre a Via Campesina
podem ser obtidas em www.viacampesina.org.
7 Maiores informações sobre a RIAD podem ser
obtidas na página da organização: www.riad.org.
8 O Fóro de São Paulo esteve reunido no
México em fevereiro de 2001e publicou uma carta aberta a sociedade, onde
apresenta seu posicionamento a respeito da integração nas américas.
9 As fontes são o USDA, para produção
agropecuária e a OMC para os dados de comércio.
10 Os instrumentos de política de
apoio interno utilizadas pelos EUA podem ser analisadas com mais detalhes
em Integração nas Américas, Uma Abordagem a partir do Rural - Deser,
novembro de 2000.
11 Dados da PNAD 2000.
12 Os números se referem a todos os
estabelecimentos que produzem, não estando separados aqueles que tem maior
integração com o mercado.
13 O mecanismo de união
aduaneira do Mercosul tem sido tema de inúmeras divergências entre
brasileiros e argentinos. O governo brasileiro tem atuado na defesa e
manutenção do mecanismo. Isso garante maior poder de negociações para o
Brasil e para o bloco. Os argentinos por sua vez, entendem que a Argentina
tem necessidade de estabelecer sua própria política aduaneira, propondo o
fim da TEC.
14 Fonte:
<http://www.conab.gov.br/publicacoes/indicadores/1201-impostoimportacao.htm">
15 Os recursos do
Pronaf, por exemplo, são contabilizados na OMC como gastos em políticas de
apoio interno que não distorcem o comércio, segundo fontes governamentais.
Maiores informações sobre os gastos e as políticas agrícolas podem ser
encontradas.
16 Ver materiais do Deser sobre o
assunto.
17 Ver Acordo Agrícola do GATT.
18 Já está em circulação uma nova versão do
Acordo Agrícola da ALCA em que algumas seções, especialmente a de Acesso a
Mercados e Medidas Sanitárias e Fitossanitárias estão com versões menos
conflitivas e contraditórias.
19 Em artigo Impactos da ALCA
e do Acordo Mercosul-União Européia nas economias brasileira e Argentina,
produzido como parte dos trabalhos contratados pelo MDIC.
20 Em artigo “A Integração
Continental Assimétrica e Acelerada: Riscos e Oportunidades da ALCA” de
Luciano G. Coutinho e João Furtado.
21 Matéria disponível na página do
Mercosul,
sob o título: “Êxodo rural vai crescer no Brasil, prevê OIT”. |